Chuva de flores

Praia Norte.
RUM.
Quando? Na altura do laranja quente, em momentos de espuma e odores de respingos de sal.

" Choveram, naquela tarde, pétalas murchas e flores inteiras, quase frescas, caindo muito devagar - porque as corolas vinham rodopiando no ar, em festa, como se uma mão invisível as estivesse fazendo rodar no céu, uma por uma. Os que assistiam ao inusual dilúvio florido tinham lágrimas nos olhos, mas não se podia dizer se era de felicidade ou de algum efeito daninho da luz do sol, por se estarem esforçando a olhar o firmamento para verem a precipitação das flores. Houve quem as colhesse do chão às mãos-cheias, quem elegesse uma só, a mais viçosa que encontrasse, e com ela enfeitasse o cabelo das raparigas mais bonitas ainda que as que o eram menos tivessem também as cabeças molhadas de pétalas e, por isso, parecessem mais belas do que o costume.

Havia uma estranha sensação de felicidade no ar daquela tarde. Todos sabiam, porque era visível, que as flores estavam sendo lançadas de um helicóptero que tinha detido o seu voo sobre a praça. Era dali que chovia e não havia, portanto, mistério nenhum, qualquer espanto. E, todavia, a rara chuva de flores era realmente assombrosa. Quem ali estava tinha a cabeça dobrada para trás, sorria, esquecidos todos de que a música que se escutava estava sendo tocada por um grupo de holandeses em roupas garridas, como se o baixo e a bateria soando a compasso fossem a banda sonora de um sonho - um sonho que tinha flores jorrando do céu, música e sorrisos abertos." in O PROFUNDO SILÊNCIO DAS MANHÃS DE DOMINGO, de Manuel Jorge Marmelo, Edições Quasi, Série Inéditos da Sábado, Maio 2007.

Espero que,tal como a mim, vos abra o apetite...Depois destes parágrafos, deixei-me perder nos seguintes...

Continuação da perdição online: http://marmelo.blogspot.com/